terça-feira, novembro 21, 2006

O dom das palavras

Há alguns anos atrás, recebi um presente muito curioso e indicado para qualquer amante de futebol. Trata-se do Dicionário do Futebol - Manual do Adepto, da autoria do jornalista Luís Miguel Pereira.
Como o nome indica, trata-se de um dicionário composto única e exclusivamente por termos relativos à gíria futebolística. À medida que vamos percorrendo as páginas do livro, somos assolados por divertidas analogias, palavras curiosas, significados inesperados e muito mais. É quase como se estivéssemos a aprender uma nova linguagem, um traço de toda uma cultura gerada pelo desporto-rei.
Aqui ficam alguns exemplos, nos quais também se incluem termos da gíria futebolística do Português do Brasil:

Ameixa - Remate forte; bola (Br)
Angu-de-caroço (Br) - Jogador que executa uma marcação cerrada
Dia-sim-dia-também (Br) - Clube que participa em muitos amigáveis
Folha-seca - Remate em jeito em que a bola sobe devagar e desce em curva
Goguento (Br) - Jogador ou equipa fora de forma
Negra - Último jogo de uma série decisiva
Operário - Jogador com grande espírito de sacrifício
Pentear - Passar a sola da chuteira sobre a bola
Rififi (Br) - Confusão entre os jogadores de ambas as equipas
Soprador de apito (Br) - Árbitro incompetente
Tourada - Sequência de entradas violentas num jogo
Véu da noiva (Br) - Rede da baliza

sábado, novembro 18, 2006


A última continência

Foi em pleno Estádio de Wembley que se notou pela primeira vez a sua grandeza e a de uma selecção húngara que jamais encontrou sucessora; foi tricampeão europeu pelo Real Madrid juntamente com Di Stefano e Gento; e ficou conhecido como o "Major Galopante", alcunha que remetia para a sua capacidade atlética notável e para o seu passado enquanto jogador do clube do exército húngaro, o Kijpest, actualmente Honved de Budapest.
Disputou o Mundial de 1954 onde a sua equipa, que para além dele ainda podia contar com Kocsis e Czibor, apenas caiu na final aos pés da Alemanha,num jogo que ficou marcado pela suspeita de doping no seio da equipa germânica. Anos mais tarde, em 1962, voltaria a jogar um Mundial, desta vez pela sua segunda casa: a Espanha, país onde se exilou aquando de uma digressão do Kijpest, fugindo à ascensão do regime comunista na Hungria. Apesar do afastamento do Mundial por questões disciplinares, seria no país vizinho que viveria os melhores momentos da sua carreira ao serviço do Real Madrid, onde só não ingressou mais cedo por questões políticas.
Construiu um legado quase inalcançável no futebol; só não conseguiu derrotar a doença de Alzheimer.
Aos 79 anos, Ferenc Puskas, o Major Galopante, fez-nos continência pela última vez. De certeza que muitas mais faremos em sua memória.

terça-feira, novembro 14, 2006


Indecência

A famosa "guerrinha" entre os dirigentes do FC Porto e do Benfica continua a conhecer novos e ultrajantes desenvolvimentos com as denúncias de racismo feitas por Mantorras. Tal facto, completamente reprovável (e nem vale a pena especular sobre a veracidade do mesmo, pois todos nós sabemos que Mantorras é um alvo constante de piadas, brincadeiras e, infelizmente, ataques racistas) vem provar que o comportamento exemplar dos futebolistas de ambos os clubes no último jogo que opôs as duas equipas não foi tomado como exemplo pelos líderes de ambos os emblemas.
Sinceramente, não sei o que ambos os dirigentes pretendem com este conflito. Se é derrubar o clube opositor, esqueçam; nunca ouvi falar de nenhum homem capaz de derrubar sozinho uma instituição inteira, por isso mais vale mentalizarem-se de que ambos os clubes continuarão de pé depois do fim dos seus mandatos. O que estão a conseguir, e com uma profundidade alarmante, é denegrir a imagem dos seus clubes, quando a sua obrigação máxima é defendê-los. Além disso, todo este clima é de uma total irresponsabilidade se tivermos em conta aqueles "adeptos" (as aspas são propositadas) que levam o seu clubismo demasiado a sério e que podem ser inflamados por estes acontecimentos.
Toda esta indecência parece não ter fim, infelizmente. E pior é que pode funcionar como uma séria fonte de alimentação de fanatismo e violência entre todos aqueles que realmente vêm os outros clubes como "inimigos". Acho que, neste momento, ninguém em ambos os clubes se aprecebe até que ponto esta inimizade se pode tornar danosa. Uma total irresponsabilidade.

quinta-feira, novembro 09, 2006


Depois do Euro...vem aí um Mundial?

Gilberto Madaíl acaba de anunciar a intenção de propor uma candidatura portuguesa para a organização do Mundial'2018, ano em que o certame regressa à Europa por via da regra da rotatividade imposta pela FIFA.
Dois anos depois do belíssimo sucesso conseguido com o Euro'2004, no que diz respeito à organização, levanta-se a hipótese de um desafio ainda maior. Os portugueses certamente terão boas recordações do Euro'2004 realizado em casa: apesar do desaire na final, viveram-se dias de festa e durante um mês todos os olhos estiveram postos em Portugal. A atmosfera de alegria e folia vivida nas ruas era espectacular e, de um certo modo, a rotina diária dos portugueses ficou subitamente mais agradável de cumprir.
Além disso, a organização do Campeonato da Europa dotou o país de infra-estruturas que, se para um Euro pecaram por exageradas (8 estádios eram mais que suficientes), para um Mundial são uma base muito sólida. Obviamente, seriam necessários mais estádios e a competição está sempre sujeita a um alargamento no número de equipas - embora ultimamente tenha-se equacionado uma redução. Como tal, não é fácil determinar exactamente o que faltará em termos de infra-estruturas para um Mundial.
Contudo, há que ser realista. Foi óptimo ter cá o Euro; mas a qualidade de vida do povo não melhorou com isso. Economicamente, muitos poderão considerar uma afronta levantar-se sequer a hipótese de organizar um Mundial, tendo em conta a situação financeira do país. Enquanto existirem idosos com reformas que mal dão para um mês, apenas para citar um exemplo, organizar um Mundial parece-me um passo maior que as pernas.

quarta-feira, outubro 04, 2006


O príncipe soviético

Eles são uma espécie de contra-senso do próprio futebol. Para eles o objectivo é evitar golos, não marcá-los; são os únicos jogadores cujos erros são na sua quase totalidade fatais; e também raras vezes alguém se lembra deles como os melhores jogadores do Mundo. Contudo, também os guarda-redes têm o seu devido lugar na história do futebol: e se Lev Yashin, o Aranha Negra, foi o rei dos guardiões, então Rinat Dassaev bem pode ser considerado como o príncipe soviético das balizas.
Quando se estreou pela equipa nacional da URSS com apenas 22 anos, suspirou-se de alívio: estava finalmente encontrado o homem que poderia herdar o legado daquele que foi o melhor de sempre, Yashin. Rinat Dassaev era um guarda-redes mágico. Mágico porque tornava o impossível em real, tal e qual como um verdadeiro ilusionista. Dotado de uma extrema agilidade e reflexos incríveis, Dassaev praticamente desafiava leis da Física em algumas das suas intervenções. Como por vezes se costuma dizer, era um daqueles guarda-redes que ganhava os jogos com as suas defesas.
Dassaev fez carreira no Spartak de Moscovo e no Sevilha, tornando-se uma das primeiras estrelas do futebol soviético a fazer carreira fora do seu país, algo impossível antes da perestroika. Foi em Espanha que pendurou as luvas, aos 35 anos. Pela sua selecção, Dassaev foi internacional 91 vezes, entre 1979 e 1990. O seu momento de glória podia ter sido o Euro'88, disputado na Alemanha. Contudo, no caminho de Dassaev atravessou-se outro mito: Marco Van Basten, o "Cisne de Utrecht", cujo remate que o bateu na final de Munique não poderia ser detido por ninguém. Foi como a seta que derrotou Aquiles no único sítio possível, o calcanhar.

sábado, setembro 30, 2006


Mais do que um jogo

Em determinados momentos da vida, todos nós somos confrontados com situações em que temos de fazer escolhas, escolhas essas que por norma reflectem quais são as nossas prioridades. Contudo, nem todos nós podemos dar-nos ao luxo de escolher; há casos em que ou há alguém que escolhe por nós ou então todo o panorama da situação inviabiliza qualquer escolha, seja ela qual for.
Vem isto a propósito de Ruud Van Nistelrooy, avançado holandês que pertence aos quadros do Real Madrid. Na semana que agora acaba, Van Nistelrooy pediu autorização aos dirgentes do clube madrileno para ser dispensado do embate entre os merengues e o Dínamo de Kiev, em jogo a contar para a Liga dos Campeões, para poder estar presente no nascimento da filha. Tal pedido foi negado. Van Nistelrooy jogou mesmo contra os ucranianos e os dois golos que apontou na fácil vitória por 5-1 não apagam o facto de não ter podido ouvir o primeiro choro da sua filha.
Agora pergunto eu: onde chegou o futebol de hoje, em que um dos clubes mais poderosos da Europa, com um plantel riquíssimo, não se pode permitir a libertar uma das suas unidades de um jogo teoricamente acessível, nem sequer para assistir ao nascimento da própria filha? O futebol é suposto ser só um jogo...mas pelos vistos é muito mais do que um jogo. E isto é incompreensível.

quarta-feira, setembro 27, 2006


Caso "Meu Deus!"

Pouco a pouco, o famoso "caso Mateus" vai deixando de fazer parte do nosso quotidiano desportivo. Pouco ou nada percebo de justiça; como tal, é-me completamente impossível explicitar todas as voltas, contornos e arestas judiciais deste processo. Resta-me apenas dar uma opinião completamente leiga, que é esta: o caso Mateus é nada mais nada menos que um simples caso de "chico-espertismo".
Resumindo, isto é apenas mais uma situação como tantas outras que experienciamos no nosso quotidiano, em que A procura obter algo passando a perna a B, C e aos que forem necessários. Assim sendo, o Belenenses, que falhou a permanência durante os 34 jogos do último campeonato, descobriu uma forma fácil de ficar na divisão principal, que foi denunciar uma irregularidade praticada pelo seu adversário; o Gil Vicente, como um menino apanhado a fazer asneira, procura fugir ao seu destino de qualquer forma; e por fim, o Leixões, que se acha no completo direito de requisitar algo que não conquistou em campo. Ou seja, cada um procura ser mais esperto que o outro.
Quando já se esperava que tal situação se arrastasse, bastou uma simples mas séria ameaça da FIFA para que todos se mexessem. Até o célebre Apito Dourado conheceu novos desenvolvimentos, caso que se mantinha em lume brando já há algum tempo.
O resultado final é uma vergonha para o futebol português, nada mais. Dificilmente existirá alguém que saiu a ganhar com isto, excepto, claro, os advogados. E é por isso que, depois de tanta trapalhada, só apetece mesmo bradar aos céus.